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terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Entrevista a um velha guarda da Alma Salgueirista


Tal como tinha prometido aqui está a entrevista feita a um velha guarda da Alma Salgueirista. Espero que gostem e aproveito mais uma vez para agradecer ao ultra da Alma que aceitou responder a estas perguntas e aliás foi ele que me sugeriu estas entrevistas.
Recorde-se que a Alma celebrou no sábado o seu 26º aniversário.

Fica então a entrevista:

Acompanhas o teu clube enquanto membro da Alma Salgueirista há muito tempo? Que recordações tens dos teus primeiros jogos na curva? Que características destacas no teu grupo?
-O primeiro jogo do Salgueiros que fui ver foi em 89/90 em Espinho, jogo esse que foi decisivo na subida de divisão nessa época. Estádio lotado, ambiente electrizante à boa maneira da velha escola e lá no meio um grupo de jovens com bombos, cachecóis, bandeiras e extintores que não se calaram o jogo todo. Era puto e aquilo facilmente me cativou a juntar a eles. Naquele tempo as coisas eram bem mais simples e feitas com muita carolice mas foram bons tempos. Boas recordações foram também as várias coreografias que tentamos fazer, as primeiras deslocações por todo o país que são sempre recordadas por variadíssimos motivos quase sempre anedóticos, as primeiras faixas em pano pesadíssimas, “replicas” quase exactas de outros grupos ultra estrangeiros em moda na altura. Destaco no meu grupo o espírito de camaradagem que até hoje ainda se sente naqueles que viveram esses dias na curva de Vidal Pinheiro.

Que recordações tens do espírito ultra dos anos 80/90?
-São várias e demasiado extensas para te escrever numa só resposta por isso resumo-te o que acho mais importante. Ultra que é ultra tem que ter “O” cachecol do grupo e recordo-me perfeitamente do nosso primeiro cachecol da “ Alma Salgueirista” feito em pano que na altura custou 1000 escudos, quanto o babei e foi babado por outros. Anda hoje é bonito e original. Lembro-me também que havia quase sempre um espírito de amizade e respeito entre os vários grupos de então e connosco em especial. Havia muito mais interesse em saber o que os outros grupos faziam, principalmente italianos e tentar de alguma forma imita-los, tentando sempre ser os primeiros aqui a fazer aquela coreografia ou a cantar aquele cântico. Para mim o espírito ultra dos anos 90, que foi o que vivi, resume-se um pouco nisso, o de ser o mais original entre nós. Falta falar também das trocas de material, das fotografias em 10x15 e tantas outras coisas que quem viveu sabe o que é. Dava-se, sem dúvida, muito mais valor aos detalhes que já descrevi aqui.

Qual o teu significado da palavra ultra?
-Para mim o significado da palavra ultra é o de se saber viver em grupo o teu clube, as tuas cores. É sentires que pertences a uma família que gosta das mesmas coisas que tu, que está numa bancada a fazer o mesmo que tu em prol do teu clube. É ser mais que o simples adepto que só se preocupa com o clube nas duas horas do jogo. É ser irreverente e saber ir contra a maré quando é necessário tudo para defenderes as tuas ideias ou as tuas cores.

Como tem sido a experiência nos escalões inferiores? Fala-nos um pouco de como têm sido estes últimos anos.
-Tem sido uma agradável jornada para mim acompanhar o meu clube nos distritais. Confesso que torcia o nariz quando se falou na altura que o clube ia ser refundado num campeonato distrital. Tudo isso passou quando percebi que mais importante que a divisão em que o clube se encontrava era a paixão que nos move em prol do clube. Compreendi que é melhor ter um objectivo concreto e lutar por ele nestas divisões do que andar a penar anos a fio no meio da tabela na primeira liga. Estamos sempre a aprender algo. São os objectivos que movem a massa adepta dos clubes. É bonito de ver terras que até aqui desconhecia por completo serem invadidas por salgueiristas e de cada jogo nosso nesses sítios ser encarado como um jogo grande para esses clubes e suas gentes. É um futebol mais genuíno, que é vivido de forma mais intensa pelos atletas, nota-se que há amor a camisola. É reconfortante jogar sempre a horas e dias decentes, não sentir que estás a ser explorado pelos chulos do nosso futebol profissional. É uma aventura que só quem a vive te sabe explicar, recomendava a todos os grupos esta experiência. Só sinto a falta de outros grupos para se tornar perfeito.

Manter um grupo vivo numa cidade como a do Porto, não é fácil certamente. Têm conseguido atrair os mais jovens para a vossa claque? Ou eles viram-se todos para o Porto?
-É mais simples do que parece, porque quem lá está é verdadeiro. Nunca fomos muitos nem nos preocupamos em sê-lo. Quem gosta do Salgueiros normalmente já tem isso nos genes porque é passado de pais para filhos. Só nos importam os que lá estão. Outros vêm e vão procurar outras coisas noutros lados.
Depois de tantos anos a percorrer o país para acompanhar o teu clube em algum momento pensaste em deixar esta vida de ultra?
-Claro que já, quem nunca pensou nisso é porque não viveu realmente o que é ser ultra. Ser ultra não tem só coisas boas, não são só aqueles bons momentos que são lembrados quando estamos juntos. Falo por mim como é óbvio, porque é difícil fazer compreender a pessoas importantes na nossa vida e que nem sequer gostam de futebol, o que é isto de ser Ultra. Lógico que a experiência de vida nos faz pensar muito nisso e a definir prioridades mas o vício ainda é mais forte.

Com o passar do tempo nota-se que em muitos grupos a velha guarda vai desaparecendo, quais as razões que levam a essa situação? O teu grupo tem sido muito afectado por isso?
-A minha resposta vem no seguimento da anterior, com os anos as pessoas são obrigadas a definir prioridades nas suas vidas, uns conseguem manter esta paixão outros não. Felizmente no meu grupo as Velhas Guardas continuam bem presentes embora não com o mesmo espírito dos anos 90 mas com certeza que com a mesma Mística que nos define.

Quais os jogos que ao longo dos anos te “deram mais pica”? Os maiores rivais… e já agora também quais as amizades que construíram?
-Os jogos mais importantes para um grupo ultra são por excelência os derbies e nos não fugimos a regra. Os jogos contra o Boavista Fc tinham sempre os condimentos ideais que nos faziam perder horas a fio a preparar a coreografia ou aquelas frases que na altura começavam a aparecer no nosso burgo, bons tempos. Os jogos em casa com os grandes também eram importantes para nos mostrarmos no nosso movimento. Recordo-me também de sempre tentar saber no inicio de cada época quando seriam os jogos contra os Belenenses porque eram duas partidas especiais para ambos os lados onde a confraternização reinava antes e depois do jogo, durante a partida muitas vezes não havia condições….

Actualmente quais os grupos com mais valor em Portugal?
-Eu acho que cada grupo tem sempre algo que se destaca dos demais tanto pela positiva como pela negativa. Admiro muito o Colectivo 95 porque se há grupo de verdadeiros e da Velha Escola em Portugal são eles. Admiro também os Panteras, os South Side porque sei o que eles estão a passar na pele e por se manterem fiéis ao seu estilo e ideais de sempre. Admiro muito alguns grupos que considero de Nova Guarda como a Bracara Legion que fazem um trabalho notável para se integrarem no nosso movimento não se rendendo aos facilitismos que outros usam. E claro não podia deixar de falar da Fúria Azul, uns verdadeiros.

Tens algum grupo estrangeiro com o qual te identifiques ou tenhas uma admiração?
- Não tenho nenhum grupo estrangeiro em particular que admire, posso te falar de estilos que gosto. Adoro o estilo Italiano porque foi desde sempre a bíblia dos ultras, adoro a “piromania” dos gregos e toda a sua loucura que conseguem envolver num estádio de futebol, adoro o estilo rude e da velha escola dos balcans, se há verdadeiros neste mundo devem de estar por aqueles lados. Tudo o resto vem um pouco atrás desses estilos creio eu.

Que pensas do movimento casual?
-É uma moda como foram a dos Skinheads do meu tempo, vem e passa ou sofre alguma mutação. Gosto do estilo de vestir embora não ache que isso seja importante no apoio ao teu clube nem de te mostrares aos outros no meio ultra. É também uma forma de passares mais despercebido no crescente controlo policial que temos sofrido nos últimos anos embora ache que já nem isso nos valhe. Ainda brincamos aos casuais aqui em Portugal.

Acreditas que o Salgueiros tem capacidade para regressar à 1ª Liga?
- Não creio que o Salgueiros nos próximos tempos vá ter condições para ambicionar uma subida aos escalões profissionais de futebol nem é isso que preocupa os sócios do clube. Sem condições desportivas reais como um estádio de futebol próprio e um suporte financeiro seguro não vale a pena pensar nisso. Resta-nos a determinação em conseguir manter a equipa principal de futebol a competir. Não é fácil mas nem tudo na vida que nos dá prazer é fácil.

Na tua opinião existe uma ligação entre os problemas do nosso país e os aspectos negativos que se vêm nas claques nacionais?
-Se não conhece-se bem a nossa cultura de sermos um povo de brandos costumes diria que nem estamos em crise. Somos um povo de pacatos e acomodados que tem medo e preguiça de agir contra o que quer que seja. Não se vê grande revolta popular pela situação em que o país se encontra. As curvas não são excepção ao resto da sociedade.

O que pensas dos jovens de hoje em dia? Que diferenças encontras entre a tua juventude e a actual? Achas que esta geração mais jovem vai conseguir melhorar o movimento em Portugal?
-Creio que esta geração tem o nome adequado, geração “playstation, são uns acomodados sem vontade própria nem personalidade para fazer certas coisas. Óbvio que há excepções e que a minha geração não escapa a esses defeitos mas creio que esta juventude perdeu alguns valores de associativismo. Perderam-se hábitos saudáveis que a minha geração tinha de pertencer a algo, de crer fazer certas coisas, de mostrar valor, rebeldia etc. Mas provavelmente já a geração do meu pai dizia o mesmo ou pior da minha. Por enquanto ainda cá estamos para segurar as pontas das curvas, espero pelo futuro para ver.
Para ti quais os grandes males que estragaram o futebol e as claques?
-Foram varias as razões mas as principais foram o preço elevado dos bilhetes que se praticaram durante uma boa década e os horários absurdos que semana a semana as pessoas são forçadas a aturar para ver as suas cores em campo. Vejo jogos no distrital ao domingo a tarde com mais gente que jogos de primeira divisão e não é pela qualidade de futebol que se pratica nem pelas condições dos estádios que as pessoas vão a bola.
Qual a tua opinião sobre o movimento em Guimarães?
- Guimarães é um caso único em Portugal de casamento ideal entre uma cidade e um emblema. Faz falta ao nosso campeonato mais uns 5 ou 6 clubes como o Vitória para termos um campeonato excepcional. Já tivemos isso a uns bons 20 anos atrás quando comecei a ver bola. Infelizmente vejo o movimento ultra em Guimarães um pouco estagnado e muito dividido. Adorava ver aquela bancada do rei com um grande grupo ultra sólido e com mentalidade duradoura. Mas não acho tudo mau, ainda há bons ultras em Guimarães.

O que pensas destes espaços na internet? Blogues, fóruns… São necessários?
-Acho que são bons canais de comunicação, a informação é instantânea e fácil de se obter. No meu tempo ansiava pelo próximo número da revista ultra para saber as novidades ou ver as fotos do nosso movimento. A internet revolucionou isso tudo. Mas nem tudo é bom, como a informação é mais fácil, torna-se descartável e sem ser devidamente filtrada as pessoas começam a perder o interesse no movimento. Sinto falta das revistas porque são um bom exemplo de como se preserva a história do nosso movimento, na internet não creio que isso seja tão fácil de conseguir.

Desejas acrescentar algo mais? Deixar alguma mensagem para os ultras portugueses e visitantes do blogue?
-Honra aos verdadeiros, eles sabem quem são.